(Guru underground)
Por: Diego El Khouri
guru das noites malditas
lisergia pura de encantos mil
outsider "vagabundo do dharma"
sax translúcido-não-lúcido
"seja dionisios" na terra, no céu
no encontro dos mares
guru underground
"vá de retro, satanás!"
esse blues, essa noite
esse "raio de sândalo"
essa tempestade selvagem
que descreve nas bacantes
eurípedes, o poeta trágico,
é sina de bardo: caminho do Sol
levante sobre o céu lilás
o espírito de neal cassady
mergulha em cada palavra
em cada símbolo vivo
em cada gole de veneno,
vidas testemunham os moinhos,
café quente na caçarola
bêbados em bares de solidão
marias bonitas prenhes da luz
do último tiro de espingarda
desse cão farejador
filhos da puta da última estância
no recôndito transcendental
dos filhos de nitiren
encontro abrigo e leito,
as muralhas da poesia subversiva
que fez casa e gerou sementes
trouxe à tona (sempre)
o dionisíaco que habita em nós
"um bom trago desse veneno!"
as vísceras esfacelam páginas
amareladas pelo acaso
— pelo tempo de proust e bergson
a não linearidade cronológica
que esmaga as massas
no medo fabricado pela dependência
crisálidas flores, "clísteres de êxtase"
vulvas molhadas pelo desejo
mortal de perpetuação (delírio, fogo)
deuses famélicos obsoletos
demoníacas formas de visão
augustas ruas fétidas-sublimes
"a arte dos quatro ventos"
homem canábico (tv quebrada)
encerra nos olhos o olhar tempestivo
boca seca, suspiro da noite
o grito da noite, a fome na noite
a escuridão gélida da noite
nesse quarto, nessa sala
nessa parede ensimesmada
areia movediça, planície azul
arrepio na nuca, allen ginsberg,
"a ditadura do rosto humano"
nos pegou de assalto?
piva enfiado no (cu)me da morte
na praça da república do delírio
willer com seus demônios a la nietzsche
bebe o mijo de marquês de sade
homem prolífico da anarquia
"deus boêmio" fratricida,
a poesia é como o ácido
escriturário da loucura
"traficante das palavras"
no calabouço dean moriarty
william burroughs e Lorca gritam,
suas vozes ultrapassam planícies
tristes mulheres dançam
clowns ultrajantes gargalham
e eu aqui "dando milho aos pombos"
produtores sangue-sugas
angélica idiotia patológica
arsênico metaloide condutor
do mais intenso calor
assim no "teatro da crueldade"
na porrada no meio do estômago
na abstração da forma semi nua
nos abismos que separam
"a via crúcis" do corpo e da alma
um poeta se apresenta
se investiga, se desnuda
porque a nudez é necessária
como um sopro no raio de sol
beijo quente colhido na manhã
translúcida dos amores loucos
nuvens elétricas adjacentes
reverberam no orbe estrelar
dessa cristandade mórbida
o sacrifício e o vinho (lado a lado)
numa comunhão bizarra
entre o céu e a terra.
pela cripta de bocage
no "férvido transporte"
do êxtase supremo
rubens zachis mescalina
na ponte circular dadaísta
nos rodízios suicidas
no trapézio torto da morte
na clínica psiquiátrica
em algum ponto da cidade
dependurado
cabisbaixo
em posição de lótus
(vista embaçada)
180 graus para a direita
face no chão
lentamente,
lentamente,
lentamente...
o pássaro de edgar allan poe
na janela espreita olhares
devora a nossa comida
revira gavetas , armários
e a gente nem nota
e a gente nem percebe
o pássaro de Edgar allan poe
à noite aparece, invade à janela
bebi a nossa bebida
revira nossas entranhas
e a gente nem nota
e a gente nem percebe
quando amanhece (luz do céu)
o pássaro de Edgar allan poe
(palheta e pincel em riste)
assovia um canto baixinho
e a gente nem nota
a gente nem percebe
quando anoitece (trevas no céu)
o pássaro de edgar allan poe
fuma o nosso cigarro
veste nossa roupa
e a gente nem nota
a gente nem percebe
o pássaro de edgar allan poe
"como um velho bandido"
na encruzilhada (olhar vivo)
espreita a lua louca vadia,
os sinos delirantes da aurora
transpostos no mármore da noite
no raio ígneo de iluminação
o pássaro de Edgar allan poe
é eu e você, irmanados
no canto amarelo da página
emergidos em êxtase supremo
dançando aqui e acolá
a dança ditirâmbica ancestral
que pulsa nas veias dos poetas
dos lunáticos e amantes
como Shakespeare falava
lágrimas lânguidas lascivas
lustram a face niilista do bardo
(aquele que anda sobre a brasa
multifacetado de linguagens)
eis aqui o bardo-bárbaro
paracelso-laboratório-hospedagem
na gaiola livro umbral city kit cheque
navalha na porta do mercado
zincum in Brazil, the word louco
perambula nas ciências malditas
rubem zachis no hospício disse
"mas quando for o fim
quem sabe alguém vai se lembrar de mim?
do nada que eu sou"
das minhas semelhanças com o abismo
rubens zachis mescalina suicida
I don't khown I don't khown
que caminhos te levam às plagas
escarlates purgatórias de alghiere?
há alguma Beatriz? Alguma dulcineia?
paixão? beijo? amor? carinho?
"moinhos lindos" translúcidos
transitam no trânsito tântrico
tétrico torto triste travado tempo
tento flutuar pela abóboda celestial
atravessar para o outro lado
cuspir em bandeiras e estados
(suas mãos manchadas
com o sangue dos índios kaiowas
suas mãos maculadas pela escravidão
pelos séculos de mortes estúpidas/absurdas)
um olho de tigre tik tak remember
la contradición pueril sociedade sonora
primitivista selvagem blake rimbaud
na cidade ensolarada do rio de janeiro
naquela jacapaguá de atribulações
"dentro dentro dentro
dentro da américa pré colombiana"
"o amor das américas nos embala"
a fibra ótica solar nos envolve
clarão/budhi/ fogo/mel/ dança
reino incerto de doce insensatez
quem pariu o desespero ambulante da noite?
quem tragou para dentro de si
as últimas gotinhas desse amor?
quem trouxe para perto do peito
as fotos vibrantes daquele lindo fevereiro?
quem alimentou espasmos de susto
quem cuspiu altares aveludados
de um veludo que enforca e asfixia?
quem suspirou paixões de terceira classe
com bazucas de ferro em recintos
de vinte mil decibéis?
quem dançou na ponta do pé
um "samba bravo violento" sobre brasa quente?
quem crivou de bala a manhã sem graça
repleta de crianças sem estômago e voz?
quem engoliu as pirâmides de El Cantare
nas ruas sujas de Goiânia ou em qualquer outro lugar?
quem deflorou a "flor imunda de jade"
"numa manumissão schopenhaueriana"
de doce tato, vil e sem cor?
quem entortou a língua, feriu e cuspiu
trânsfugas existências do abismo
em finos cortes na alma e no corpo?
quem fez promessas de amor a luz da lua
com os lábios grudados na avenida anhanguera
ou em algum beco dessa cidade bela?
quem esporrou calor no trânsito vulgar
que escarneceu os sonhos de outrora
e empurrou para a fila do cinismo
entes queridos nos sanduíches da lamentação?
quem no sacrário abre as portas e entorpece o dia?
quem em vã ilusão entregou ao firmamento
a cara desnuda de cristo "no país dos banguelas"?
quem quebra garrafas e desliza sobre rimbauds
nos foscos fúnebres no néctar verde do mar?
quem tropeça-cai-levanta-mexe-sobe-volta-corta
rasga o céu e alimenta a hóstia sagrada da purificação?
quem, como vulcão, explode e como vulcão vê
a desordem e a ordem vigente (vi gente- vi gente-vi gente morta,
morta nas favelas e quebradas
voando e caindo em todo o lugar
em todo lugar: voando e caindo)
seus olhos atravessam cascatas
acordes sonoros de energia solar
somente semente, grão de areia
e nada mais...
esses olhos, olhos negros, negros de trevas
tétricas trevas, paraísos maiores
são olhos que envolvem e movem e traçam
paisagens, lançam âncoras ao mar
esses olhos negros, trevosos
rasgam meu peito, esbofeteiam minha cara
me abraçam esses olhos
olhos negros, serenos
— frios e quentes
como todo olho deve ser (?) —
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