(Por Diego EL Khouri)
Carlos Saramago nasceu em 1972 em Abrantes, cidade portuguesa pertencente ao distrito de Santarém, na sub-região do Médio Tejo, na região Centro. Portador de epidermólise, doença, que além de bolhas no corpo provoca mutilações nas mãos, pinta desde muito cedo numa compulsão incrível. Sua arte (que perambula pelo surrealismo, retratos, caricaturas, óleo, acrílico, aquarela, azulejos, etc) é uma exposição nua e crua de seus sentimentos e ideias. Uma arte intensa, rica de beleza e espanto, que fascina e embriaga. Tive o prazer de entrevistar esse "contador de histórias" como ele mesmo prefere se definir. Eis abaixo a entrevista e algum de seus quadros:
"eu sou metáfora de cada tela." Carlos Saramago
1)
Comece nos contando como foi seu início na pintura e se houve algum tipo de
repressão na família em relação ao seu dom.
Recordo-me
que, na altura, não tinha nenhuma opção de escolha, devido à minha saúde. Mas
sentia esta força que me empurrava para os desenhos. A minha família aceitou
bem a minha escolha.
2)
Quais suas influências no campo da arte e se passou pela sua vida algum mestre
próximo com quem aprendeu a pintar?
Comecei
por fazer desenhas da Marvel. Adorava todos aqueles heróis e até pensava que
era um deles! (risos). Desenhava-os e recortava-os. Eram os meus brinquedos,
porque não havia dinheiro para comprar outros.
Quando
deixei a escola e fui até à Suíça, descobri os pintores de rua e travei
conhecimento com Giorgio Rotilio e Samy. Comecei a pintar no atelier deles. Em
1993, o Giorgio convenceu-me de ir pintar para a rua a seu lado. Posso dizer
que foi ele o meu mestre.
3) Quando pinta inspira-se numa temática, num objeto
exterior a si, ou é puro exercício técnico e intelectual?
Costumo
dizer que o facto de pintar é apenas curiosidade.
Sou autodidata Esta busca de perfeição é a tentativa de elevar os meus sonhos e
de torná-los reais.
É
numa tela que a minha loucura se vê... o Ser que eu gostaria de ser.
A
minha arte influencia todo o meu estado de espírito. Tento sair de dentro e
colar-me numa tela. O meu interior visível.
4) O que pretende
transmitir com sua arte e em que corrente se insere?
Bem,
nunca penso nisso. Dizem que o meu estilo é surrealista, mas acho que é só o
estilo de Carlos Saramago. Pedaços de sentimentos soltos que se misturam numa
tela.
Acredito
que, quando pinto, tento contar uma história, transmitir um pouco de mim. Cada
um interpreta-me à sua maneira, lê o que sente naquele momento. Nunca arrisco
dizer "estou aqui, e tu?".
Uma
pintura é apenas uma ilusão.
5) A
arte transmite o contexto de uma sociedade. Na sua pintura portanto, transita
inúmeros símbolos, pensamentos e idéias. A catarse e imagens
chocantes e intensas fazem parte primordial da sua psicologia visual e é uma
produção extremamente constante. Nos diga por quais caminhos sua
arte percorre e até que ponto sua vida particular ou traumas íntimos interfere
no resultado final de um quadro.
Na
realidade, penso ser o mesmo que todos vêm na minha obra. Muito comercial que
desvia por vezes em caminhos mais íntimos... mais perigosos... que muitas vezes
sinto... ou não...
Muitos
trabalhos meus são apenas a tentativa de traduzir sentimentos alheios, apesar
de colocar sempre algo que me pertence na tela. A minha vida reflete-se muito
no que pinto.
Afinal,
sou um contador de histórias.
6)
Ainda se lembra do primeiro quadro que pintou?
Não
me lembro. Perdi a conta de quantos trabalhos pintei. Pinto desde os 16 anos e já não
consigo recordar.
Sei
que desenhei muita coisa má e muita coisa boa. Algures entre os dois,
espalhadas, semeadas... um Carlos Saramago que ninguém iria lembrar...
7)
Qual a maior dificuldade para quem escolhe a arte como profissão e não apenas hobbie?
Sou
da opinião que os artistas de rua são frequentemente indevidamente catalogados
como "desenhadores sem futuro". Sou um desenhador de rua, mas
reconheço que me dão valor pelo trabalho construído. Tive muita sorte de
encontrar as pessoas certas.
Mas
ainda há muito a fazer para provocar a evolução da mentalidade Portuguesa.
Ninguém compra arte nem a considera como um investimento. O público costuma
andar distraído ou finge sê-lo...
Quanto
aos galeristas, admito nem sempre os entender. Continuam a ser abrutes da
sociedade das artes, com critérios que deixam, muitas vezes, a desejar... Quem
tem "nome" pode entrar! Os outros...
Viver
da arte ainda é Surreal, mas é possível fazer da arte a nossa vida.
8)
Quais artistas da nova safra mais lhe agrada?
Dos
Artistas-vivos portugueses, gosto da influência de Luiz Morgadinho, Fernando d'
F. Pereira, Júlio Pomar, entre outros. A lista conta mais de 50 (risos)
E,
claro, o maior surrealista de todos os tempos: Dali.
9)
Qual seu livro de cabeceira?
O PROFETA de GIBRAN KHALIL GIBRAN
10)
Para terminar, quais são seus novos projetos e quando virá ao Brasil expor seus
quadros?
Sou
um aventureiro. Nunca sei onde estarei amanhã. Mas, num futuro próximo, já
estou a estudar e sonhar (risos) fazer exposições na Espanha, na Suíça e na
Inglaterra. Tenho alguns amigos no Brasil, país que irei descobrir em 2014, mas
ainda procuro locais para poder expor lá.
Perfeita entrevista, muito bem conduzida pelo Diego com indagações precisas e ao mesmo tempo esmiuçando a vida do artista Saramago. Esse, não acho palavras adequadas e certas e que sejam justas pra defini-lo. A arte dele é para ser antes de mais nada sentida, vivida com toda a intensidade. As cenas estão ali, às vezes dispersas, soltas mas sempre interligadas por um elo lúdico e surreal. Ele transforma suas loucuras íntimas em histórias multicoloridas e passionais. A arte de Saramago são sonhos permeados de beleza.
ResponderExcluirCaro Amigo, excelente entrevista! Fiquei a conhecer mais um pouco de ti! Grande Abraço
ResponderExcluirMuito bom conhecer um pouco mais do artista Saramago por sua própria ótica. Seu trabalho é interessante. Eu sei que nem sempre entendo os seus desenhos, mas procuro sentir o que ele quer dizer com suas imagens e cores.
ResponderExcluirParabéns, Saramago. Parabéns, Diego EL Khouri!
Valeu!
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirMuito boa a entrevista, as perguntas foram as que a gente gostaria mesmo de saber, adorei quando ele disse: "Sou um aventureiro. Nunca sei onde estarei amanhã." Nesse ponto me identifiquei muito com ele e ainda lembrei de um poema de Alberto Caeiro (Fernando Pessoa) que fala sobre o Rio Tejo, vou postar no corujão da poesia.
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