sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

NAVEGANTES


Poema:Álvaro Nassaralla
Desenho: Diego El Khouri




Círculo de prata lavado, lua
cava o azul anil céu
com a lamúria própria dos navegantes.

É que desancora o barco do dia
já deslizando longe
botando o sal gasoso
da maresia por púrpura desacordo.

Vamos
a abrir os veios das rotas impuras como quem teima.

Teimam os que
mais, tramando a teia das palavras,
vieram em missão de ver e falar.

Puxo as redes e cardumes de estrelas
e poeira das eras, estão-me às mãos.
As fragatas todas
que um dia navegaram casadas
a marujada cansada de guerra a içar velas,
estão-me aos olhos.

Aldebarã: não se atrase nas profundezas da galáxia:
rasgam-me ao peito incalculadas bravatas:
zarpar é ordem do coração borboleta.

– Que mistérios podem ainda ?

– Que balcões podem ainda rasgar os cascos
dando água, engolindo as almas?

A aceleração das órbitas engolfando de preamar,
a laminação das ondas,
a safra de estrelas salpicando as taças do céu
podem assistir por entre onde entra o quarto-crescente
as primeiras notícias do arrastamento das correntezas
como camadas esponjosas de coração sem hora
como a imensa língua de mar
levemente esgarçada à dentro das enseadas,
como as tatuagens velhas nos pulsos do tempo
a meio cálculo das rotas quebradas
da teia que insere incursões de marinheiros lascivos
nos randevus feridos à beira-porto.

Quando são, mar e céu, um só:
navegantes.

21/jan/1
4

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

BEBENDO O POEMA

(DIEGO ELKHOURI RELATANDO ALGUMAS  SENSAÇÕES QUE TEVE AO LER UM POEMA DE PLANCHÊZ)


* na foto: Edu Planchêz e seu filho Ícaro Odin

Me vejo dentro desse mergulho, na faísca que ninguém compreende, na força ultrajante dos "vadios" que deitam em camas de espinhos e ainda ri da dor famigerada na busca do insondável, na fome de quem procura estrelas como um demônio insaciável... "Girassóis de ouro" e brilho escarlate... Percebo sua poesia, Edu Planchêz, na camada fina de "tênue desejo", do inconformismo dos que são rotulados (nesse mundo frio e raso) de loucos, medíocres, improdutivos e desajustados. Também sou "a vergonha das famílias que sentam na 'poltrona num dia de domingo'," mas bebo como um devasso também as "dimensões alucinadas dos transes desconexos" e do fogo rimbaudiano que nos torna além de bandidos, luminosos profetas. "Poeta tem que cair na vida, deixar de ser broxa pra ser bruxo" já dizia outro irmão de jornada. Fiz e faço da vida o que poucos acreditam... Como você "esmigalhei os relógios de ponto em nome do novo, do além, do que nem eu compreendo"; te entendo como a alma que sopra e vomita arte buscando uma vida inimitável como os gregos antes Platão/a estética da vida em obra de arte... Podem nos taxarem de doentes, improdutivos, idiotas, criminosos e dejetos humanos... Mas temos muito aliados e eles sim percebem as jóias que temos cravadas em nossa alma e o brilho difuso e intenso que despejamos de nossa áurea delirante e febril e percebem, entendem nossa missão, bebem de nossa seiva a luz. Belo poema, amigo! Estamos cravados na história do tempo, no tempo de poucos "iluminados, visionários e sonhadores". Estamos fazendo nosso caminho sem beijar os cús de bundas sem graça e vendidas. (Diego El Khouri)

Abaixo o poema:


Antonio Eduardo Planchêz de Carvalho ( edu planchêz )

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"Antonio Eduardo Planchêz de Carvalho,
mandei dinheiro suficiente
em janeiro e fevereiro para pagar as contas de luz,
você não pagou porque gastou com outras coisas.
Já experimentou trabalhar um pouco com um trabalho honesto para pagar suas contas?
Sua idade e sua saúde maravilhosa
lhe permitem ainda ter um trabalho
com carteira assinada de um homem normal,
800,00 reais você tira mole como porteiro de edifício ou guardador de automóvel
já que não se preparou para nada na vida.
Me sinto constrangido de ter de dizer isso a você,
mas correr atras de mulher você sabe.
Se não pode pagar a luz pelo menos economize luz"
( Seu Pai)

Pai, perdoa-me por ser poeta-cantor,
por ter feito na vida o que não acredita,
por andar que nem um gato faminto à caça da rata poesia,
das dimensões alucinadas, dos transes desconexos,
das mulheres ultrajantes
Preferi as ruas, rasguei as carteiras de trabalho,
esmigalhei os relógios de ponto
em nome do novo, do além,
do que nem eu compreendo

Pai, eu nunca economizei luz, nenhuma luz,
segui a maldição, dos "vadios", dos que nada são,
toquei no resto dos restos, no embrião
Pai, se das estrelas não consegui arrancar moedas,
trouxe do inconsciente o ouro ouro, o ouro de tolo,
a vergonha para todas as famílias
que sentam na "poltrona num dia de domingo"

Não fui, não sou o filho que o senhor desejou,
sou o filho que desejei, o capeta que não para de falar,
que a todos atrapalha e encanta, sei lá
Pai, gratidão

Seu filho, Edu Planchêz (antônio eduardo)

domingo, 12 de janeiro de 2014

NA TRINCHEIRA




(Por Diego EL Khouri)

- entre  a lucidez e a loucura -

sufocado  de “morte azul”
dependurado na boca do inferno,
a última festa, o último trago
pirando ardendo enlouquecendo
como chama intensa/passageira
três convulsões naquele novembro maldito
sobrevivi a um blecaute em São Paulo
agosto prenúncio... os olhos se esfregam...
que constelações removem íris
para dentro de umbigos castos?
quem morde as coronhas dos fuzis
e esfrega lama e fezes em toda sua dialética?
 arrancam dos ventres o peito camuflado de dor...
não pensem em mais nada!
assassinei a metáfora como a paz verdejante
que perdi por aí, não sei onde...
bêbado, louco, QUERO SAIR DAQUI!
desse país, desse estado, desse planeta!
mas antes, antes de partir
deixo para vocês isso aqui:
minha alma nua, quebrantada e cheia de tesão.

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

PLASTIC ONO BAND DE JOHN LENNON - UM BELO DISCO!


(Por Diego EL Khouri)






Esse primeiro disco do John Lennon após a separação oficial dos The Beatles é lindo! Plastic Ono Band é um dos álbuns que sempre revisito. A bateria da primeira faixa (Mother) me deixa numa onda de êxtase intensa. Ouvindo agora me deu uma puta vontade de aprender a tocar bateria! É lindo ouvir sua voz melodiosa vomitar esses versos "Children, don't do what I have done/ I couldn't walk and I tried to run/So I, I just got to tell you/Goodbye, goodbye". Working Class Hero me dá vontade de quebrar tudo ao redor, As soon as you're born they make you feel small (Logo que você nasce, fazem você se sentir pequeno)... When they've tortured and scared you for twenty odd years/ Then they expect you to pick a careerParece que me desnudou a alma ao cantar tais versos: They hate you if you're clever and they despise a fool/ Till you're so fucking crazy you can't follow their rules (Eles te odeiam se você é esperto, desprezam se é um idiota/ Até que você esteja tão louco que não consiga seguir as regras deles). Os medos dessa sociedade sangue-suga na música Isolation. O niilismo de God é do caralho (!!); "Deus é um conceito/ Pelo qual medimos/ nossa dor"; "Eu não "acredito em mágica/Eu não acredito em I-ching/ Eu não acredito em Bíblia/ Eu não acredito em tarô/ Eu não acredito em Hitler/ Eu não acredito em Jesus/ Eu não acredito em Kennedy/ Eu não acredito em Buda/ Eu não acredito em Mantra/ Eu não acredito em Gita/ Eu não acredito em Ioga/ Eu não acredito em reis/ Eu não acredito em Elvis/ Eu não acredito em Zimmerman/ Eu não acredito em Beatles". Remember, contra todo tipo de dominação, prolonga ainda mais esse niilismo. My Mummy's Dead é de uma profundidade poética incrível! Love como uma resposta positiva a todo pessimismo bastante presente no disco: Love is real, real is love. "Sentamos e conversamos sobre revolução/ Como dois liberais no sol"; "Nós dois estávamos nervosos sentindo culpa/ E nenhum de nós sabia por quê". Poderia horas e horas falar sobre esse disco (e é assunto bom de debater, principalmente em mesa de bar), mas o melhor mesmo é ouvir Plastic Ono Band no último volume!! Mergulhem nesse mar alucinante!

...É sempre bom revisitar o que é belo!
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JOHN LENNON
Álbum: Plastic Ono Band
Ano: 1970

Faixas:
(Todas as músicas foram compostas por John Lennon.)

Lado A

1.    Mother
2.    Hold On
3.    I Found Out
4.    Working Class Hero
5.    Isolation

Lado B

1.    Remember
2.    Love
3.    Well Well Well
4.    Look At Me
5.    God
6.    My Mummy's Dead

domingo, 5 de janeiro de 2014

ATÉ ENTÃO



(Por Diego ELKhouri)

Não acredito nessa noite opaca
onde a única luz são sirenes doentes
onde talento tornou-se miséria
e ousadia em simples limpeza de casa
onde a vida inimitável
transformou-se em lama
e a poesia até então necessária
num campo de flores sem contemplação.

Abismo e perigo: fotografia passada.
27 anos - mais um trago.