terça-feira, 7 de junho de 2011

ULISSES AESSE - O JORNALISMO VIVO

(Por Diego EL Khouri)


A poesia se encontra viva e submersa na alma e na vida desse grande  artista contemporâneo. A centelha da luz divina que cuspiu em seu ser toda força que a palavra necessita: intensa e cheia de barulho. Formado em jornalismo pela Universidade Federal de Goiás (UFG), Ulisses Aesse já agregou em sua jornada infinitas existências. Além de ter sido um dos fundadores do jornal-zine da UFG, o  Rola Bosta, formou ainda no anos 80 a banda punk Exame de Fezes que no início contava com a participação do fotógrafo Zuhair Mohamad e o artista plástico Edney Antunes. Ainda na década de oitenta assumiu a editoria do Jornal Diário da Manhã além de ser presidente da ONG Caminho (Way) em prol do meio ambiente. Conhecedor da essência diáfana da poesia, esse demônio (ou anjo) da palavra me concedeu uma entrevista que posto aqui nesse blog:

Você,  que se encontra  no Diário da Manhã já há um bom tempo, de que forma
vê o jornalismo?
 
O jornalismo é um sacerdócio. Uma devoção. Fazê-lo é acreditar na
verdade, na interpretação sem vícios, sem erros. Faço um jornalismo
que seja verdade. Que transpire a verdade. Não faço jornalismo para
manipular, para pressionar, para intimidar. Não acredito no jornalismo
como jogo, mas como uma leitura dos fatos. Entendo, também, que
jornalismo é indústria, é produto. Por isso, passível de erros. Erros
comuns ao mercado. Logicamente que não há jornalismo, como conceito,
imparcial, puro. Jornalismo, como atividade humana, é conflitante,
espelha a própria sociedade. É preciso encontrar uma fórmula para que
se faça um jornalismo respeitável e comprometido com os que constroem.
Jornalismo é construção do verídico. Distorcê-lo é comprometer a sua
verdadeira essência.
 
 
A massificação da mídia, o poder dominando as comunicações, a luta para
ignorantizar o povo e o ensino real sendo caçado nas escolas, é verdade
triste que impera a sociedade. De que forma então  fazer ainda um jornalismo
sem se corromper? É uma espécie de heroísmo?
 
Podemos fazer um jornalismo transparente, sem dissimulações. Para
isso, é preciso que a sociedade conheça quem está por trás da câmara,
do microfone, do computador. É preciso mostrar o coração do
profissional, abrir sua consciência para que seu público saiba que não
está sendo manipulado. Manipula exige apenas perspicácia. Quem
manipula tem intenções paroquiais, pessoais. Isso é ruim. O bom
profissional põe seu peito para fora e não teme a exposição de idéias.
Jornalista deve expor os fatos, se possível, interpretá-lo dentro da
ótica de quem o lê sabe a sua opinião. Não podemos deixar que o
jornalismo seja apenas um fruto da massificação, da chamada indústria
cultural. O poder que domina os meios de comunicação, também, domina
as instituições como as academias, as igrejas, as entidades de
classes. Só se corrompe quem quer se vender. E se vende, às vezes, até
por um 'muito obrigado'.
 
 
Tua poesia é uma lapidação cuidadosa da linguagem. Porém há nela uma pegada
envolvendo o êxtase e o delírio poético. De que forma surgiu seu primeiro
livro?
 
A poesia é um fluxo do inconsciente. Uma turbulência que nos invade
naquele momento. Faço poesia num jorro de ideias, onde o vício está em
cada verbo. Vejo o verbo se derramar à minha frente, como cachoeiras
de palavras. A poesia, em si, não tem explicação. É um jorro de
conteúdo que você vai acumulando com o tempo e com a experiência da
emoção, do exercício da retórica, vem como se fosse drops de palavras,
de sentenças. Trabalho o delírio, o êxtase como tempero para que as
palavras não sejam duras como os discursos dos políticos, nem com as
sentenças dos tribunais. Nelas, nas poesias, me ponho de joelhos, com
os olhos voltados para Deus. Um exercício de purificação da alma. Há,
em cada verso, um sorriso desesperado. Um soluço de quem ama. E um
aceno para quem vai.
 
Um poeta nasce poeta ou se torna poeta pelo não enquadramento nas normas
estabelecidas pela sociedade?
 
O poeta nasce, se faz, se educa. É preciso, antes de tudo, gostar da
poesia. Amá-la como se ama um filho, os pais, o chão onde nasceu. Não
se pode dizer que o poeta é algo de outro mundo, alienígena. O poeta
hoje, nas suas várias linguagens, observa a tudo, atento, como se seus
olhos estivessem ali, em cada momento, escrutinando os ossos, o
invisível. Um poeta tem idade, religião, profissão, amor, ódio. Um
poeta tem RG, CPF e razão. Logo, o poeta está aí, ao seu lado,
sentado, como se fosse um cidadão. E é. Um cidadão que vê, ao longe,
os sinos nas conchas; o mar, virado de cabeça para baixo, como se os
peixes fossem estrelas. Um poeta é assim, se faz assim: sempre sem
fim.
 
 
De que forma você vê a arte hoje?
 
Vejo a arte como algo comercial, vendáve, venal. Uma arte perdida, mas
necessária. A arte perdeu seu referencial de construção, de educação,
para virar discurso de poder, de grupos que se revezam nas riquezas. É
preciso desnudá-la, colocá-la com a 'vergonha de fora'. Fazer com que
passemos a respeitá-la pela sua castidade, não pelo seu valor. Não há
algo mais magnífico do que as pinturas 'pintadas' por Deus no céu. Na
aurora, no pôr do Sol. No nascer da Lua. Quero crer que tudo, num dia,
vai mudar. Mesmo tendo a certeza que não.
 
Qual sua opinião sobre a legalização da maconha?
 
À princípio sou pela discussão, dissecação completa do tema. Não há
como ter um discurso já formulado, já embalado. A maconha, pelo que
conheço, não traz nada que prejudique o caráter de uma pessoa. Ainda à
princípio sou pela sua descriminalização.
 
 
Você como jornalista como vê a política atual?


Um tanto quando conturbada. O Brasil valoriza muita as intrigas
políticas. A imprensa principalmente. Sou favorável a deixar os
políticos em paz e apenas denunciar as suas corrupções ou atos
decentes. E não vê-los como Midas. A política no Brasil é feita por
uma casta que se locupleta enquanto a maioria do povo se lasca. É
preciso mostrar a indigência frente a esta realidade. Inclusive, com a
participação nas redes sociais, denunciando os verdadeiros picaretas e
mercenários que temos. Aliás, talvez, faltaria dedo para teclar seus
nomes nas redes sociais.
 
 
Nos fale sobre seu segundo livro que está pra sair, o Amarás a quem?
 
 
É, como o primeiro, uma ode ao amor e à razão. Nada que distancie o
amor do ódio, o sim do não. O livro nada mais é que um discurso pela
vida, pelos sentimentos que nos movem nos passos da vida. Amaras
quem?! é uma pergunta que faço para o espectador, para que ele se
sintonize e reflita: é possível amar neste tempo de espantalhos? Quem
ler o livro abrirá o espírito. Uma fenda há de fazê-lo pensar sobre a
razão e o amor.
 
 
Jornalista, poeta e músico. fale sobre seus projetos musicais.


Tenho mais de 25 anos de estrada musical. Tudo começou em um barracão,
alugado, na Avenida Contorno, no Centro. Ali nasceu a banda Exame de
Fezes. Depois a Maqna Rock. Logo após, outras bandas Sofá de Carne, ET
de Vagina, Picolé de Nervo, Los Hervalifes e outros projetos que estão
em andamento. Tenho a música no sangue como elemento de contestação.
Como algo que possa protestar contra as injustiças. Nosso casting é
voltado para o punk. Alguns projetos serão executados brevemente como
o retorno da Maqna Rock, Eu, Welliton Carlos e Carlos Brandão estamos
discutindo a sua volta, um espaço para a música, para o rock, o blues,
o jazz. Para tudo.
 
 
Uma poesia para dar um ponto final triunfal nessa entrevista.
 
 
 
Dobra o corpo de si e do
sino ao corpo do homem
 
(Nas vísceras padece um homem pegajoso)
 
Dobra o corpo do sino neste imenso
maundo
imerso no caos
e te prendes ao amor
fecundo que fenece
nestas névoas-flores de espinhos.
 
Amarás a quem?
 
Em sinônimo de sigo mesmos
ou no fundo andrajoso dos outros?
 
Fenece nos olhos imersos
— ilhados em lágrimas —
feito céu maravilhado
ou de um corpo em cio.
 
(Descobre a ti mesmo)
 
As horas em cristais
estigmatizam com doçura
as arestas do tempo
e no bate-bate de cores
amarás como ama a ti mesmo
no campo lindo e oblíquo de
teus seios.
 
Amarás a quem?
 
Em sinônimo de sigo mesmo
ou no campanário que destila
a vida de quem te ama?
 
(Fenece como pedra imolada
nos abismos dos corpos)
 
Amarás feito verdura no verão
à espera do sol que a frutifique
e a maravilhe
— em cachos —
como peixes que carregam
doçuras nas barbatanas de (amar-te)!
 
Amarás a quem?
 
Neste domínio de poucos,
concentrando a ilusão
de ser no tempo
rumo ao vento
com opacos seres nas mãos.
 
No corpo encontrarás fagulhas
que submergirão e ascenderão
em brasa o calor do teu amar-te.
Lubrificarás o ódio que tens em ti
e só em ti frutificarás.
 
Tu te prendes ao amor amado?
 
Nas flores fenecem os espinhos.
 
Amarás a quem?
 
(Nas vísceras, tortuoso,
padece um poeta em fiapos,
e o céu e o mar destinam seu ser)
 
Ameaça-te a não ouvir
o sino, também,
é grande o desgosto pelos
dings-dongs que acolhem
em nosso peito
e no revérbero do sol a pino,
todo jovem
padece a sino.
 
E no caminho simples prende-te
ao tempo trazendo no mesmo
a estranheza das almas
e aos elos que traduzem
em dois versos antigos:
 
Amarás a quem neste mundo
imerson em caos e abismo?
 
Dobra o corpo de ti e do sino
ao corpo do homem e alegra-te
em ofertar-te,
soltando risos
livres pelos lábios.
 
E pergunta a ti mesmo:
A quem amarás?
 
Ave, geral.
De bando e raça (a vida roça
a vida de amar-te)
 
No fundo do reflexo de (olhar-te)
como quem olha nas vísceras
um homem em andrajos
a amofinar-se em desejos
 
Dobra o corpo menino
ao amor ubíquo
e sibile a todos e a ti mesmo:
Amarás a quem
neste mundo de abismos?
 
E por trás do homem
o silêncio caminha
sem si e sem pernas
para (amar-te),
sem tempo e sem ódio,
o lado do silêncio de agora,
o lado do amor de amanhã.
 
Amarás a quem,
neste tempo de espantalhos?

4 comentários:

  1. Gostei Diego, muito boa a entrevista. É bom saber a opinião de reais profissionais do jornalismo, hoje em dia tão confundido com atualização instantânea sobre qualquer ato de celebridades...

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  2. Obrigado pela opinião, Janaína. Aliás, é bom destacar o trabalho gancho-antena-futurista que Diego El Khouri tem feito. Outro aliás: falta há tempo em Goiás (essa fase eu já vi, mas sumiu, como num passe de mágica)essa cultura alternativa. Na década de 70 era chamada de 'Poesia Alternativa' ou 'Poesia Marginal', com grandes nomes como Cacaso, Touché, Ulisses Tavares (meu xará), Leminski, Nicolas Beher e tantos outros que fizeram os outsiders existirem.

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  3. Grande Ulisses! Muito bacana a entrevista.

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  4. sou seu fan.vc sabe disso/ agora mi ajude a ser vereador. quem sabe eu sou o jobes da vez; um abraço de seu fan joao banana

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