terça-feira, 10 de janeiro de 2017

TEXTO DE DIEGO EL KHOURI

Texto que saiu no blog do escritor Winter Bastos. É editor do zine O Berro e trabalha em vários outros projetos. Tive o prazer de conhecer esse grande ativista em 2010 na cidade de Niterói (Rio de Janeiro). Link da entrevista que fiz com ele: http://molholivre.blogspot.com.br/2011/05/winter-bastos.html


Blog do Winter que saiu esse meu texto: http://expressaoliberta.blogspot.com.br/

ABISMOS E PARAÍSOS
(Por: Diego El Khouri)









Sou um homem sem especialização nenhuma, sem profissão, ritos ou dogmas. Talvez a minha falta de autenticidade e talento me faça ter uma relação diferente com as artes. Não sou o único que trata dessa incapacidade – a "impotência que dá forças". Tom Zé mesmo retrata isso muito bem quando se coloca, não só no contexto histórico (lembrando de sua importância no tropicalismo e sua volta triunfante pelas mãos do David Byrne do Talking Heads) mas também frente a frente ao seu processo criativo. Costumo dizer que meu trabalho é uma espécie de laboratório. Por isso essa necessidade de experimentação: as inúmeras linguagens (poesia, artes plásticas, cartuns, ensaios, aforismos, fanzines, etc). Não tenho cursos, faculdades, autenticidade e muito menos talento. Sou uma sombra, um transeunte pulsando poesia. Com as mudanças significativas que ocorreram na Europa entre os séculos XVIII e XIX, em especial a Revolução Industrial, com o fim das manufaturas e a máquina cada vez tendo um espaço de destaque, obrigou o homem a se especializar em uma coisa só e o tempo impôs essa “mecanização” do indivíduo culminando com a necessidade de “especialização”, essa característica que está além de meu campo de visão ( o time is Money). Não estou alheio a esse mundo e como muitos historiadores também considero os avanços tecnológicos do século XX e XXI como a terceira etapa da Revolução Industrial. O computador, a internet são exemplos disso. Estou ligado no meu tempo e não tem como fugir. Meu passado punk não me deixa desmentir. Mas o fato é que a vida “errante dos poetas”, a existência como uma “viagem inimitável”, a “transgressão dos sentidos”, “os confins da noite” e todo tipo de mergulho, foi e está sendo minha grande fonte de criação. A fragmentação e o dizer “sim à vida mesmo diante de todos seus problemas” que os beats e simbolistas proclamaram (não esquecendo que Nietzsche começou isso tudo), a “distorção psicodélica” do expressionismo alemão, a teoria do inconsciente de Freud, as drogas, a subjetividade do nonsense, a ligação desde sempre com as minorias, a cultura das ruas, os desajustados de toda espécie, moldaram (e vem moldando) meu trabalho. Numa época de total competição, onde “é necessário” pisar na cabeça do próximo indireta ou diretamente, e “vencer na vida” a qualquer custo é implantado através de ideias mesquinhas ausentes de solidariedade, andar contra a maré é para poucos. Não vejo “heroísmo” nisso e sim incapacidade de ser diferente, de agir de outra forma. Na altura da vida, uma existência intensamente sentida, onde experimentei de tudo (ou muita coisa), mergulhado em “abismos” e paraísos”, lutando contra essa falta de talento, me encontro no curso da estrada, e mesmo com tudo contra, a poesia sempre esteve ali, diáfana, forte, presente, em chamas. É pra ela que devoto minha atenção. É nela que mergulho minhas chagas e alegrias. A gênese do delírio.




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