terça-feira, 21 de janeiro de 2020

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Por: Rogério Skylab

Ele prepara a cena. O objetivo é anunciar os prêmios, mas ele sabe que o discurso que antecede o anúncio vai reverberar. Ninguém no ministério tem a sua verve. Traz um longo passado de polêmicas, mas esta ultrapassará todas as medidas. O corte do cabelo, a música de fundo, as palavras pronunciadas com segurança e altivez. A pesquisa histórica.

Nada é gratuito.

Eu revejo a cena. É extremamente profissional, ao contrário da fala miúda e grosseira de seu comandante. Nós temos ali um homem do teatro. É como em Hamlet: a verdade vai ser desnudada no palco diante do impostor. A sua performance é arrebatadora. Já vinha sendo antes: a sua violência contra a primeira dama do teatro brasileiro recebeu uma chuvarada de protestos. Ele se posiciona, de um modo suicida, contra tudo que defendeu anteriormente.

Alguns chegam a mencionar uma espécie de surto. Personifica Goebbels. Huck fica horrorizado. O presidente do congresso pede providências. Um artista maldito afirma nas redes sociais a favor da arte degenerada, que era como o próprio Hitler denominava desdenhosamente a arte moderna. Notas de repúdio se multiplicam. E algumas minorias ficam horrorizadas duplamente: com a reatualização do fascismo; e com a demonstração de força da comunidade judaica, que pressiona o Palácio (nesse momento, essas minorias têm plena consciência do que são).

O efeito da cena é violento e rápido. No mesmo dia da representação, o ator recebe o comunicado do seu afastamento. O impostor teria visto sua imagem no espelho? Ou antes, o rei-impostor teria sido levado, contra a própria vontade, a proceder a demissão? Talvez o projeto do ator era levar a farsa por mais tempo.

Foi uma sexta-feira fulgurante. Não que o ator desejasse aquele desfecho tão abrupto. Mas antes de dormir, se posta diante do espelho e posso até vislumbrar um esgar em seu rosto - quase um sorriso.



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